domingo, 11 de julho de 2010

A GÊNESE, OS MILAGRES, AS PREDIÇÕES e as espiritices brasilianas...

Saudades do Herculano... Em meados dos anos 70 a FEESP lançou uma tradução do Evangelho Segundo o Espiritismo substituindo algumas palavras usadas pelo autor francês. Por exemplo, como o termo "odiar" é - oh! - muito forte, mudaram para "amar menos"; e outras infantilidades do mesmo nível. Herculano saiu a campo para denunciar tamanha ousadia dos que se julgam melhores que o autor a ponto de acharem que ele foi infeliz na escolha das palavras de sua obra. Ora, escrever é um ato de escolha. Um autor é ou não bem sucedido justamente em função das palavras que escolhe. Isto é escrever! Como alguém pode se arrogar competência para alterar as escolhas de um autor de sucesso, principalmente alguém que não tem sucesso?
Claro que um tradutor também tem uma ampla área de escolha; mas, sempre balizada pelo autor original.
Agora, trinta e tantos anos depois, me deparo com outra dessas. A Léon Denis Gráfica e Editora, do Rio, lança uma tradução da Gênese "atualizando" Kardec: substituindo "léguas" por "quilômetros"; figuras de linguagem bonitas, como "a velocidade do relâmpago", por "velocidade da luz"; e aí afora. E não é, a velocidade do relâmpago, a mesma velocidade da luz? Além do quê, não era usual, na época de Kardec, medir as distâncias em "anos-luz". O pior é o título do capítulo "Uranografia Geral", nome então em moda e escolhido pelo autor, Camile Flammarion, que o atribuiu a Galileu: virou "Astronomia Geral". O "Caráter da Revelação Espírita" vira "Fundamentos da Revelação Espírita"!
A Gênese de Kardec, por transitar na área científica, é a mais pontual de suas obras, a mais datada; cheia de teorias ultrapassadas a respeito da Lua, de Marte, da geração espontânea; daí que seria impossível "atualizá-la" completamente. Ante isto, em grande parte da obra o tradutor ou revisor opta por notas de rodapé, explicando as desatualizações. Ora, por que não fez logo isso em todos os pontos do livro, evitando cair no crime moral de adulterar um autor morto, de desfigurar sua obra e retirá-la de seu contexto histórico e cultural?
Louve-se, claro, a boa intenção da tradutora e da editora em resgatar o texto comprovadamente kardeciano do livro "A Gênese...". De passagem, informamos que Kardec, em vida, providenciou quatro edições da sua Gênese, todas idênticas, feitas com as mesmas matrizes.
Três anos após sua morte, seu sucessor, Leymarie, lança uma 5ª edição "revista, corrigida, aumentada", com enormes diferenças para com as três primeiras. Henri Sausse denuncia o fato em 1884; assunto que abordo em outro artigo. Mas, mesmo sendo elogiável o ato da editora e tradutora em fazer o devido resgate, isto não lhes dá o direito de adulterar a linguagem do autor a pretexto de "atualizá-la"

Um comentário:

  1. Os dois últimos parágrafos foram corrigidos na cachola do autor por pesquisas posteriores. Permanecem aí como foram escritos para demonstrar nossas contradições ao longo do tempo. Se bem que, apesar de várias pesquisas, não posso, até hoje, afirmar de as alterações entre a 4a. e a 5a. edições são de responsabilidade do Kardec, do Leymarie ou do acaso.

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