"Em filosofia, em psicologia, em moral e em religião, só é verdadeiro o que não se afaste, nem um iota, das qualidades essenciais da Divindade". Kardec, G,II,19.
Mais adiante, no capítulo III do mesmo livro, quando ele discute sobre o instinto,apresenta várias hipóteses e, depois, diz com muita propriedade:
"Todas essas maneiras de encarar o instinto são necessariamente hipotéticas e nenhuma tem uma característica suficiente de autenticidade para ser tida como a solução definitiva. A questão, por certo, será resolvida, um dia, quando estiverem reunidos os elementos de observação que ainda faltam. Até lá, é preciso nos limitarmos a submeter as diversas opiniões ao cadinho da razão e da lógica e esperar que a luz se faça."
Científico? Então vejamos como ele finaliza:
"A solução que mais se aproxima da verdade será, com certeza, a que melhor corresponda aos atributos de Deus, isto é, à soberana bondade e à soberana justiça". Kardec, G,III,17.
Talvez resida em coisas assim a rejeição de muitos acadêmicos ao espiritismo: o medo de que, pela generalização do kardecismo, toda a ciência e a filosofia se vejam obrigadas a subordinar-se a princípios como estes. A ciência -- ou o que a ela se assemelhava na época --, já esteve subordinada à religião, à fé, à crença em coisas reveladas estabelecidas como verdades incontestáveis. E o saldo foi de atrasos e dores. Quando a ciência conseguiu o direito a ser laica, cética e irreverente, permitiu ao homem acesso a conhecimentos importantes na física, química, astronomia, saúde, etc. Agora, aparece uma revelaçao que, dizendo-se ciência, ameaça subordinar a pesquisa a premissas sobre atributos de uma divindade que nem todos aceitam.
Não me estranha que, dez meses após ter publicado isto, Kardec baixou a bola e reconheceu que o espiritismo é "religião em certo sentido".
Bem, meu caro João, dado que o Espiritismo não é ciência, não há porque preocupar-se com uma "epistemologia" própria. Aliás é curiosa a ciência que precisa de epistemologia própria para se constituir como ciência.
ResponderExcluirOlá Antonio,
ResponderExcluirEu não ousei considerar o assunto uma "pseudo-epistemologia", como o faria um cético. Então, usei (ou abusei) do termo apenas como o tratamento de um problema sob determinada diretriz filosófica -- no caso, a espírita.
Nem se trata de ser cético. A parapsicologia coaloca-se como ciência e tem pressupostos e fundamentação epistemológicos. O Espiritismo faz parte da história da parapsicologia. É isso
ResponderExcluirPara enriquecer o diálogo, transcrevo o que escrevi no facebook, em resposta ao Mário, que não conseguiu postar aqui, mas de quem conheço em grande parte o pensamento e concordo com ele:
ResponderExcluirObservações como essas que faço, essas coisas dogmáticas que garimpo em Kardec, dirigem-se mais àquelas pessoas para quem, numa visão simples, o espiritismo é ciência e pronto.
Pois, ao raciocínio "o espiritismo é ciência e não religião", muito comum nas redes sociais, eu não oponho este outro: "o espiritismo é religião e não ciência". Se alguns, conciliadoramente dizem que o espiritismo "não é uma religião mas tem religiosidade", outros poderão dizer, com a mesma propriedade, que o espiritismo "não é ciência mas tem cientificidade". E nem um nem outro terá problemas em demonstrar sua religiosidade ou sua cientificidade.
Certas pessoas são acusadas de ficarem em cima do muro, quando, na verdade, elas podem estar acima do muro, ou de muros.
Para sua própria definição o espiritismo exige um novo paradigma; e, por isso mesmo, não sei até que ponto ele provoca ou colabora com este novo paradigma.
Kardec realmente se perde nessa parte transcrita, misturando alhos com bugalhos, e que, diga-se de passagem, acontece várias vezes no referido livro.
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