Comecemos pelo neologismo espiritismo. Segundo a primeira edição do Houaiss vem do francês spiritisme (1857), que por sua vez vem do inglês spiritism (1856). Pesquisas recentes recuam sua utilização em livros e revistas de língua inglesa de 1853 e 1854. A trajetória do neologismo indica o caminho da idéia: o espiritismo é um movimento que surgiu nos Estados Unidos da América sob os nomes de new-spiritualism e spiritism (o primeiro acabou por adquirir predominância), foi trazido pelos seus entusiastas para a Inglaterra, onde se disseminou sob o nome de spiritualism, e, logo a seguir, para a Europa Continental, onde atingiu várias camadas da sociedade sob os nomes franceses de spiritualisme e spiritisme (este último adquiriu predominância no continente). Na França o movimento encontrou-se com a filosofia. Havia uma certa disponibilidade de filósofos ociosos provocada pela ditadura de Luís Napoleão Bonaparte. Aliaram-se os órfãos do até então "ditador filósofo", o espiritualista e eclético Victor Cousin, com alguns socialistas utópicos impedidos em suas tertúlias políticas, e passaram a interrogar os espíritos de forma mais consistente. O escritor Victorien Sardou juntou toda a produção resultante desses diálogos e solicitou ao Professor Rivail, talvez o mais sério e maduro do grupo, que a pusesse em ordem. Rivail construiu com o material toda uma metafísica, ainda que no estilo literário do diálogo com a manifesta intenção de fugir ao espírito de sistema, e a publicou sob o título de "O Livro dos Espíritos", tendo como subtítulo "Filosofia Espiritualista" -- o que denuncia a influência eclética do Cousin. Reinvindicou para esse corpo doutrinário o nome de spiritisme, identificou os espiritos dialogantes como grandes nomes do passado -- São João, São Luís, Santo Agostinho, Sócrates, Platão, Lammenais, etc. --, e ultrapassou a vã filosofia enveredando para o terreno tipicamente religioso, declarando que tais espíritos tinham sido enviados pelo próprio Deus para inaugurar uma nova era para a humanidade, inserindo-o na sequencia das revelações ocidentais: o judaísmo, o cristianismo e, agora, o espiritismo -- como se fora o primeiro, o segundo e, agora, o terceiro testamento. Iniciou dessa forma o grande movimento do espiritismo filosófico; ou, espiritismo moral, segundo Sudre; ou, espiritismo religioso, segundo Flammarion, Aksakof, Richet, e outros; ou, simplesmente, espiritismo kardecista, segundo Sausse, Leymarie, e todos os citados anteriormente -- e todo mundo. Este Espiritismo sobreviveu aos demais. Os demais foram: o espiritismo científico, representado por Aksakof, Flammarion, Delanne, Bozzano, Lombroso e Geley, desaparecido com a morte deste último; o espiritismo místico do Roustaing; e o espiritismo envergonhado que se chamou de "pesquisa psíquica", "metapsíquica" e "parapsicologia", de Crookes, Richet, Rhine e outros. Hoje em dia, graças à democracia, à crescente liberdade individual e à ausência de qualquer direito autoral sobre o nome, existem, ao lado do espiritismo kardecista, uma série de espiritismo à moda da casa ou do sujeito. Fim.
Fontes: "A Mesa, o Livro e os Espíritos", de Aubrèe e Laplantine; "Revista Espírita", de Kardec; "Memórias Biográficas e Filosóficas de um Astrônomo", Flammarion; "História da Filosofia", de Padovani e Castagnoli; mais pesquisas citadas neste mesmo blog, sob o título "Da-auto-geracao-de-mitos-ou-da-geracao de auto-mitos, etc." sendo imprescindível não ignorar o comentário corretivo.
quarta-feira, 5 de dezembro de 2012
quarta-feira, 15 de agosto de 2012
SOBRE O DIÁLOGO COM OS ANTI-RELIGIOSOS II
Mais algumas considerações que me surgiram nas conversas facebookeanas.
A coisa é tão simples e tão fácil de compreender. Vamos nos abstrair, por alguns momentos, de toda esta discussão falaciosa, cheia de piadinhas desconectadas e de respostas de efeito plagiadas dos gurus orientais. Vamos a um acontecimento recente, conhecido de todos, para entender as diferenças entre a ciência e o espiritismo pretendido pelos ortodoxos kardecianos.
Todos conhecem a NASA. Uma instituição respeitadíssima nos meios acadêmicos, industriais e tecnológicos de todo o mundo, responsável pelos inúmeros avanços da comodidade moderna, conseguidos como sub-produtos de sua exitosa corrida espacial que na semana passada conquistou mais uma vitória colocando um novo equipamento de pesquisa no solo marciano. Pois bem, em dezembro do ano passado a NASA manifestou-se em canais de comunicação que cobriam todo o mundo -- e conseguiu a atenção de todo o mundo --, para comunicar que descobrira uma nova forma de vida num lago americano, vida essa que incorporara em seu DNA o arsênio em lugar do fósforo. Apesar de toda a autoridade conquistada no trabalho árduo anterior, não posaram -- e nem seriam aceitas se tal -- como reveladores cujos conteúdos deveriam ser incontinenti incorporados aos anais doutrinários da ciência. Não. Expuseram ao vivo a síntese do trabalho, e, numa publicação científica -- Science -- detalharam a metodologia empregada, as fundamentações, os testes, os resultados, etc. Imediatamente, vários outros laboratórios e centros de pesquisas puseram-se a reproduzir seus experimentos, a fazer a necessária análise e crítica ao método, a, enfim, tentar confirmar ou refutar os resultados. Dois centros de pesquisas, dois estudos independentes, puseram por terra as afirmações dos eminentes cientistas da NASA, demonstrando exatamente onde estava o erro: a presença mínima de fósforo, tão mínima que desprezada pelos cientistas, era suficiente para manter a forma de vida e sua resistência ao arsênio, tornando-a um extremófilo.
Bem, vamos ao espiritismo ortodoxo kardeciano. Seus adeptos (como afirmam categoricamente se tratar de uma ciência, poderíamos dizer: seus "cientistas"), afirmam com ares de certeza que os conteúdos filosóficos e morais de sua doutrina foram transmitidos a Kardec -- rebaixado à condição de simples secretário -- pelos Espíritos Superiores comandados pelo Espírito de Verdade. Quais as fundamentações epistemológicas, a metodologia empregada, os testes, etc., para chegar-se a este resultado? Ah, o Controle Universal do Ensino dos Espíritos! Pulando certas verdades inconvenientes, como o fato de que ciência não se faz de "ensino" e, sim de pesquisa -- a educação é que se faz de "ensino", mas o educador, como dizia o próprio Kardec, é um "revelador secundário", e a ciência é feita pelo "revelador de ponta" -- , ou, ainda, o fato de que um princípio não se torna verdadeiro por eleição ou plebiscito, vamos, por obséquio, aos detalhes da metodologia. É mister uma crítica ao método, a fim de superar suas falhas. Como reproduzimos os experimentos, para verificarmos os resultados? Quais os passos necessários? Foram seguidos? Por quem? Ah, por Kardec. Ele disse que fez assim, que tinha mil centros e coisa e tal, e Kardec é um homem honrado, a sociedade espírita de Paris é respeitável, merecem credibilidade. (Alguém aqui duvida da respeitabilidade da NASA e da honradez das meninas que fizeram o experimento?). Bem, então, por mais honrado que ele seja, suas alegações no Item II da Introdução do ESE não podem ser tomadas como conhecimento científico, uma vez que não há a menor demonstração do método utilizado. Vamos, então, tentar reproduzí-lo? Hoje é difícil, diriam, os médiuns são todos religiosos, têm idéias divergentes, muita liberdade. Será que Kardec os tinha totalmente homogeneizados numa unanimidade nelsonrodrigueana? Não, é que os planos de Deus previam a revelação ali, naquele momento, por isso as condições foram divinamente reunidas; a nós, pobres pósteros, resta o consolo de aceitarmos, acreditarmos, estudarmos humildemente as obviedades ditadas pelos espíritos superiores, e, com isso, "evoluirmos" -- seja lá o que isto signifique.
Igualzinho ao caso do Moisés, a quem Deus concedeu apenas duas audiências, e a partir daí a humanidade é que engolisse e praticasse religiosamente suas leis machistas e capitalistas.
Ufa! Precisa escrever mais para discorrer sobre as diferenças práticas entre ciência e religião; entre espiritismo e ciência?
terça-feira, 14 de agosto de 2012
SOBRE O DIÁLOGO COM OS "ANTI-RELIGIOSOS"
Eu peço perdão se minha argumentação inadvertidamente ofende alguém. Mas, minha intenção é apenas demonstrar a alguns nossos irmãos de humanidade o quanto são religiosos sem o saberem. A diferença entre certos espíritas que se consideram laicos e aqueles outros que se assumem religiosos é a mesma diferença existente entre o luteranismo e a igreja católica. Lutero deu uma limpada no cristianismo da igreja católica, excessivamente influenciado por elementos paganistas, mas continuou defendendo as mesmas crenças básicas. Certos espíritas que arremetem, às vezes até colericamente, contra o movimento espírita, apenas o limpam de um excesso de práticas místicas acrescentadas ao longo do tempo, mas continuam defendendo religiosamente certas crenças básicas, como a missão divina do espiritismo e a eficácia de um controle de "ensinos" do qual nem mesmo a aplicação foi demonstrada historicamente. E reagem a qualquer tentativa de questionamento ou falseamento, tanto quanto o reagem os religiosos.
A única diferença entre os seguidores da reforma protestantes e certos espíritas auto-denominados "não religiosos", é que o reformador daqueles não afirmou que estava fazendo uma "ciência".
Na verdade, quem teima em manter o espiritismo como uma religião, são os que se aferram a uma "Codificação" transformada em cânone sagrado: inquestionável e irrefutável.
É possível transformar o espiritismo em ciência. Mas, prá isto seria necessário entender a contribuição de Kardec como importante, porém cheia de falhas e anacronismos que precisam ser substituídos pela livre e descontraída discussão, tanto quanto pela pesquisa e refutação.
O Espiritismo baseado em crenças, tal como professado pelos ortodoxos religiosos ou ortodoxos laicos, é religião. "Duela a quin duela", como disse certo presidente. E Kardec identificou isto claramente quando relacionou as crenças espíritas no famoso discurso da RE-dez-1868, finalizado com a afirmação categórica, porque expressão da realidade: "eis o Credo, a religião do Espiritismo".
Esta é a mais pura e cristalina realidade que qualquer inteligência mediana retira da kardequiana ou publicações posteriores e que nenhum discurso eivado de insinuações sobre a ignorância doutrinária do interlocutor, ou ancha de piadinhas cuja relação com o texto é difícil estabelecer, irá obscurecer.
Agora, saindo do terreno das crenças dogmáticas, colocando-se Kardec e os Espíritos Superiores no seu devido lugar -- apenas uma escola da filosofia espírita --, e ampliando-se a abrangência do espiritismo para outras contribuições, teorias, pesquisas e experimentações, teremos conseguido guindá-lo à condição de ciência ou filosofia.
Não sou contra ou a favor deste ou daquele; apenas constato a realidade.
É preciso ter consciência das coisas. O Espiritismo entendido e praticado como religião encontra respaldo na própria kardequiana; já demonstrei isto à exaustão.
Por isso, as pessoas que assim o praticam têm o direito de serem respeitadas em suas louváveis e consequentes crenças. Os que o querem "puramente" filosófico e científico, laico e sem crenças, que saibam vivenciarem-no assim.
quinta-feira, 7 de junho de 2012
MAIS UMA OBSERVAÇÃO À EPISTEMOLOGIA ESPÍRITA
Veja este trecho de Kardec, na Gênese, no capitulo "Caráter da Revelação Espírita", onde ele trata das formas de aquisição e acumulação do conhecimento espírita, o que, em termos técnicos, seria a epistemologia:
Mais adiante, no capítulo III do mesmo livro, quando ele discute sobre o instinto,apresenta várias hipóteses e, depois, diz com muita propriedade:
Científico? Então vejamos como ele finaliza:
Talvez resida em coisas assim a rejeição de muitos acadêmicos ao espiritismo: o medo de que, pela generalização do kardecismo, toda a ciência e a filosofia se vejam obrigadas a subordinar-se a princípios como estes. A ciência -- ou o que a ela se assemelhava na época --, já esteve subordinada à religião, à fé, à crença em coisas reveladas estabelecidas como verdades incontestáveis. E o saldo foi de atrasos e dores. Quando a ciência conseguiu o direito a ser laica, cética e irreverente, permitiu ao homem acesso a conhecimentos importantes na física, química, astronomia, saúde, etc. Agora, aparece uma revelaçao que, dizendo-se ciência, ameaça subordinar a pesquisa a premissas sobre atributos de uma divindade que nem todos aceitam.
Não me estranha que, dez meses após ter publicado isto, Kardec baixou a bola e reconheceu que o espiritismo é "religião em certo sentido".
"Em filosofia, em psicologia, em moral e em religião, só é verdadeiro o que não se afaste, nem um iota, das qualidades essenciais da Divindade". Kardec, G,II,19.
Mais adiante, no capítulo III do mesmo livro, quando ele discute sobre o instinto,apresenta várias hipóteses e, depois, diz com muita propriedade:
"Todas essas maneiras de encarar o instinto são necessariamente hipotéticas e nenhuma tem uma característica suficiente de autenticidade para ser tida como a solução definitiva. A questão, por certo, será resolvida, um dia, quando estiverem reunidos os elementos de observação que ainda faltam. Até lá, é preciso nos limitarmos a submeter as diversas opiniões ao cadinho da razão e da lógica e esperar que a luz se faça."
Científico? Então vejamos como ele finaliza:
"A solução que mais se aproxima da verdade será, com certeza, a que melhor corresponda aos atributos de Deus, isto é, à soberana bondade e à soberana justiça". Kardec, G,III,17.
Talvez resida em coisas assim a rejeição de muitos acadêmicos ao espiritismo: o medo de que, pela generalização do kardecismo, toda a ciência e a filosofia se vejam obrigadas a subordinar-se a princípios como estes. A ciência -- ou o que a ela se assemelhava na época --, já esteve subordinada à religião, à fé, à crença em coisas reveladas estabelecidas como verdades incontestáveis. E o saldo foi de atrasos e dores. Quando a ciência conseguiu o direito a ser laica, cética e irreverente, permitiu ao homem acesso a conhecimentos importantes na física, química, astronomia, saúde, etc. Agora, aparece uma revelaçao que, dizendo-se ciência, ameaça subordinar a pesquisa a premissas sobre atributos de uma divindade que nem todos aceitam.
Não me estranha que, dez meses após ter publicado isto, Kardec baixou a bola e reconheceu que o espiritismo é "religião em certo sentido".
quinta-feira, 31 de maio de 2012
LINHA DO TEMPO ESCLARECE EDIÇÕES DA "GÊNESE"
(Texto revisado da postagem de 14.7.2010, com o título "A Gênese, os Milagres e as Predições, e as espiritices brasilianas II).
("Revista, corrigida e aumentada").
Ante a polêmica a respeito das alterações feitas na Gênese de Kardec (as autorizadas, do autor, e as desautorizadas, dos que querem "atualizá-lo"; vejam postagem de 11.7.2010)), tentei elaborar uma LINHA DO TEMPO, que aqui disponibilizo para que completem, corrijam, critiquem ou desprezem...
06.01.1868 - Lançamento do livro A Gênese, os Milagres e as Predições Segundo o Espiritismo, de Allan Kardec, pela Librairie Internationale - A. Lacroix, Verboeckhoven et Co. Editeurs. Segundo Desliens - secretário de Kardec, médium da Sociedade Espírita de Paris e, posteriormente, membro da Comissão Central que sucedeu o fundador -, o contrato inicial previa uma tiragem com três edições; as fôrmas de impressão seriam de propriedade de Kardec. (Revista Espírita, jan/1868; mar/1885). OBS.: A Rouge Frères, Dunon et Fresné, citada por alguns articulista como "editores" é, na verdade, a tipografia onde foram impressas as quatro edições de 1868, da Librairie Internationale, bem como, a quinta edição de 1872, já então da Librairie Spirite.
xx.02.1868 - Kardec determina uma tiragem em brochura à parte do capítulo Caracteres da Revelação Espírita. (Revista Espírita, fev/1868).
xx.02.1868 - Kardec inicia a tiragem da segunda edição. (Revista Espírita, fev/1868).
22.02.1868 - Os espíritos apoiam Kardec na intenção de promover alterações na Gênese e o alertam para que conte com o esgotamento rápido dos volumes. (Obras Póstumas, publicação de fac-símile do próprio manuscrito de Karddec no suplemento de final de ano da Revue Spirite de 2018 e, Adair Ribeiro no Facebook).
04.07.1868 - Os guias de Kardec o incitam a apressar o trabalho de remodelação da Gênese: "Acréscimos em diversos pontos (...) e condensação aqui e ali para não tornar mais extenso o volume". E, ante a possibilidade do esgotamento das edições no mercado, dizem: "Não perca tempo: é preferível que os volumes esperem pelo público, do que este por eles". (Obras Póstumas)
xx.07.1868 - Artigo na Revue sobre a "Geração Espontânea e a Gênese".
xx.09.1868 - Correspondência na Revue sobre o capítulo "Aumento e diminuição do volume da Terra" e publicaçao do texto "A alma da Terra", que Kardec incluiria na revisão da obra, e sairia apenas na 5a. edição.
("Revista, corrigida e aumentada").
Ante a polêmica a respeito das alterações feitas na Gênese de Kardec (as autorizadas, do autor, e as desautorizadas, dos que querem "atualizá-lo"; vejam postagem de 11.7.2010)), tentei elaborar uma LINHA DO TEMPO, que aqui disponibilizo para que completem, corrijam, critiquem ou desprezem...
06.01.1868 - Lançamento do livro A Gênese, os Milagres e as Predições Segundo o Espiritismo, de Allan Kardec, pela Librairie Internationale - A. Lacroix, Verboeckhoven et Co. Editeurs. Segundo Desliens - secretário de Kardec, médium da Sociedade Espírita de Paris e, posteriormente, membro da Comissão Central que sucedeu o fundador -, o contrato inicial previa uma tiragem com três edições; as fôrmas de impressão seriam de propriedade de Kardec. (Revista Espírita, jan/1868; mar/1885). OBS.: A Rouge Frères, Dunon et Fresné, citada por alguns articulista como "editores" é, na verdade, a tipografia onde foram impressas as quatro edições de 1868, da Librairie Internationale, bem como, a quinta edição de 1872, já então da Librairie Spirite.
xx.02.1868 - Kardec determina uma tiragem em brochura à parte do capítulo Caracteres da Revelação Espírita. (Revista Espírita, fev/1868).
xx.02.1868 - Kardec inicia a tiragem da segunda edição. (Revista Espírita, fev/1868).
22.02.1868 - Os espíritos apoiam Kardec na intenção de promover alterações na Gênese e o alertam para que conte com o esgotamento rápido dos volumes. (Obras Póstumas, publicação de fac-símile do próprio manuscrito de Karddec no suplemento de final de ano da Revue Spirite de 2018 e, Adair Ribeiro no Facebook).
04.07.1868 - Os guias de Kardec o incitam a apressar o trabalho de remodelação da Gênese: "Acréscimos em diversos pontos (...) e condensação aqui e ali para não tornar mais extenso o volume". E, ante a possibilidade do esgotamento das edições no mercado, dizem: "Não perca tempo: é preferível que os volumes esperem pelo público, do que este por eles". (Obras Póstumas)
xx.07.1868 - Artigo na Revue sobre a "Geração Espontânea e a Gênese".
xx.09.1868 - Correspondência na Revue sobre o capítulo "Aumento e diminuição do volume da Terra" e publicaçao do texto "A alma da Terra", que Kardec incluiria na revisão da obra, e sairia apenas na 5a. edição.
25.09.1868 - Rascunho de carta escrito de próprio punho por Kardec, encontrado no acervo de Canuto de Abreu, dirigida a um intermediário nas traduções para o alemão, onde ele diz claramente que revisou a Gênese e a obra se encontra em fase de impressão.
(https://espirito.org.br/material/nem-ceu-nem-inferno-carta-para-intermediario-da-traducao-de-ag-para-o-alemao/)
xx.10.1868 - Última alusão na Revue à Librairie Internationale, por ocasião do lançamento da brochura contendo a correspondência de Lavater.
xx.xx.1868 - Antes que o ano termine a Librairie Internationale, de A.Lacroix, Verboeckhoven et Co.Editeurs, teria ido à falência! (Revista Espírita, mar/1885).
xx.02.1869 - O tipógrafo Rouge Frères solicita, junto ao órgão competente, em nome de Kardec, autorização para a impressão de 2.000 exemplares da Gênese.
31.03.1869 - Kardec planeja entregar os encargos do movimento espírita a uma Comissão Central e dedicar-se apenas a atividades intelectuais em sua residência na Avenue et Villa Ségur, 39, atrás dos Inválidos. Cria a Librairie Spirite, que passará a publicar e distribuir a Revue e suas demais obras, na rue de Lille, 7. O Sr. Bittard, antigo funcionário da Librairie Internationale é indicado para ser o gerente. A Sociedade Espírita de Paris também se transfere provisoriamente para o mesmo endereço. Tudo isso é planejado por Kardec para ter início em 01.04.1869.
Em meio à mudança de coisas para sua casa na Avenue et Villa Ségur e coisas para a rue de Lille, no já quase deserto escritório da Passage Saint'Anne, em 31 de março, Kardec morre! A Sra. Allan Kardec, única proprietária legal de suas obras e da Revue, após uma tentativa frustrada de convencer Camille Flammarion a sucedê-lo, decide:
"Primeiro: Doar anualmente à Caixa Geral do Espiritismo o excedente dos lucros provenientes da venda dos livros espíritas e das assinaturas da Revue, isto é, das operações da Livraria Espírita; mas com a condição expressa de que ninguém, a título de membro da Comissão Central ou outro, tenha o direito de imiscuir-se neste negócio industrial, e que os recebimentos, sejam quais forem, sejam recolhidos sem observação, desde que ela pretende tudo gerir pessoalmente, determinar a reimpressão das obras, as publicações novas, regular a seu critério os emolumentos de seus empregados, o aluguel, as despesas futuras, numa palavra, todos os gastos gerais;
Segundo: A Revue está aberta à publicação dos artigos que a Comissão Central julgar úteis à causa do Espiritismo, mas com a condição expressa de serem previamente sancionados pela proprietária e a Comissão de Redação, o mesmo se dando com todas as publicações, sejam quais forem;
Terceiro: A Caixa Geral do Espiritismo é confiada a um tesoureiro, encarregado da gerência dos fundos, sob a supervisão da Comissão Diretora. Até que seja o caso de usá-los, esses fundos serão empregados na aquisição de propriedades imobiliárias para enfrentar todas as eventualidades. Anualmente o tesoureiro fará uma detalhada prestação de contas da situação da Caixa, que será publicada na Revue." .
Por incrível que pareça, ela "foi objeto de felicitações unânimes".
(Revista Espírita, 1868/1869; Obras Póstumas).
(https://espirito.org.br/material/nem-ceu-nem-inferno-carta-para-intermediario-da-traducao-de-ag-para-o-alemao/)
xx.10.1868 - Última alusão na Revue à Librairie Internationale, por ocasião do lançamento da brochura contendo a correspondência de Lavater.
xx.xx.1868 - Antes que o ano termine a Librairie Internationale, de A.Lacroix, Verboeckhoven et Co.Editeurs, teria ido à falência! (Revista Espírita, mar/1885).
xx.02.1869 - O tipógrafo Rouge Frères solicita, junto ao órgão competente, em nome de Kardec, autorização para a impressão de 2.000 exemplares da Gênese.
31.03.1869 - Kardec planeja entregar os encargos do movimento espírita a uma Comissão Central e dedicar-se apenas a atividades intelectuais em sua residência na Avenue et Villa Ségur, 39, atrás dos Inválidos. Cria a Librairie Spirite, que passará a publicar e distribuir a Revue e suas demais obras, na rue de Lille, 7. O Sr. Bittard, antigo funcionário da Librairie Internationale é indicado para ser o gerente. A Sociedade Espírita de Paris também se transfere provisoriamente para o mesmo endereço. Tudo isso é planejado por Kardec para ter início em 01.04.1869.
Em meio à mudança de coisas para sua casa na Avenue et Villa Ségur e coisas para a rue de Lille, no já quase deserto escritório da Passage Saint'Anne, em 31 de março, Kardec morre! A Sra. Allan Kardec, única proprietária legal de suas obras e da Revue, após uma tentativa frustrada de convencer Camille Flammarion a sucedê-lo, decide:
"Primeiro: Doar anualmente à Caixa Geral do Espiritismo o excedente dos lucros provenientes da venda dos livros espíritas e das assinaturas da Revue, isto é, das operações da Livraria Espírita; mas com a condição expressa de que ninguém, a título de membro da Comissão Central ou outro, tenha o direito de imiscuir-se neste negócio industrial, e que os recebimentos, sejam quais forem, sejam recolhidos sem observação, desde que ela pretende tudo gerir pessoalmente, determinar a reimpressão das obras, as publicações novas, regular a seu critério os emolumentos de seus empregados, o aluguel, as despesas futuras, numa palavra, todos os gastos gerais;
Segundo: A Revue está aberta à publicação dos artigos que a Comissão Central julgar úteis à causa do Espiritismo, mas com a condição expressa de serem previamente sancionados pela proprietária e a Comissão de Redação, o mesmo se dando com todas as publicações, sejam quais forem;
Terceiro: A Caixa Geral do Espiritismo é confiada a um tesoureiro, encarregado da gerência dos fundos, sob a supervisão da Comissão Diretora. Até que seja o caso de usá-los, esses fundos serão empregados na aquisição de propriedades imobiliárias para enfrentar todas as eventualidades. Anualmente o tesoureiro fará uma detalhada prestação de contas da situação da Caixa, que será publicada na Revue." .
Por incrível que pareça, ela "foi objeto de felicitações unânimes".
(Revista Espírita, 1868/1869; Obras Póstumas).
01.06.1869 - A quarta edição de "O Céu e Inferno" e a edição atualizada de "Caracteres da Revelação Espírita", COM O MESMO TEXTO DA EDIÇÃO REVISADA DA GÊNESE, estão à venda na Livraria Espírita, tudo publicado por Amélie Boudet.
(https://www.facebook.com/HistoriaDoEspiritismo/photos/a.289399475157175/1176215856475528)
xx.08.1869 - A Revista Espírita de Agosto de 1869 noticia que a Madame Allan Kardec, no desejo de continuar a obra moralizadora à qual ela e seu esposo têm dedicado os últimos anos, resolve assumir a tarefa da continuidade do trabalho, incluindo a publicação das obras fundamentais e póstumas de Kardec, pelo tempo que lhe resta de vida, promovendo os planos deixados por ele, pois ela, mais que qualquer outro, possui os elementos indispensáveis para determinar solidamente as bases constitutivas. Assim, após superar as numerosas formalidades decorrentes da sucessão e estudando cuidadosamente o espírito de tais planos, resolve, com o concurso de outros seis espíritas, constituir a Sociedade Anônima de Ações de Interesse e Capital Variável da Caixa Central do Espiritismo, conforme o preconizara Kardec na Revista Espírita de dezembro de 1868. Segundo Berthe Froppo, em seu opúsculo "Muita Luz", "a Sociedade anônima fundada pela Sra. Allan Kardec tem por objetivo tornar conhecido o espiritismo por todos os meios autorizados pelas leis. Ela tem por base a continuação da Revista Espírita fundada por Allan Kardec, a publicação das obras deste, incluindo suas obras póstumas e todas as obras que tratam do espiritismo".(Revista Espírita, agosto, 1869; Berthe Froppo em "Muita Luz")).
xx.07.1870 - Descliens anuncia na Revista Espírita que a Livraria Espírita recebeu em depósito um certo número de exemplares dos Quatro Evangelhos, do Roustaing, obra provavelmente esgotada, e os coloca à disposição dos assinantes interessados, mediante o pagamento de "10 fr.50", à ordem de M. Bittard.
19.07.1870 - Desaba o teto! Estoura a Guerra Franco-Prussiana que dura até maio de 1871, destruindo o Segundo Império, precipitando a França num caos social e político, suscitando a Terceira República, terminando na Comuna de Paris, primeiro governo operário da história cujas lutas praticamente incendiaram a cidade. Os alemães vencedores só deixariam definitivamente a França em 1873 após o pagamento de pesadas "dívidas de guerra". O período de ocupação alemã foi bastante sofrível para os franceses, em todas as áreas, mas particularmente no campo editorial, tanto devido à censura, quanto devido ao altíssimo custo provocado pelos pesados impostos destinados às reparações de guerra.
01.06.1871 - Segundo informação de Desliens, esta é a data limite em que a Sociedade, a Revista e as impressões das obras de Kardec estiveram diretamente a cargo de Bittard, Tailleur e Desliens. (Revista Espírita, 1885). Presume-se que só a partir desta data Leymarie tenha assumido efetivamente tal mister. Algumas informações dão conta que Leymarie teria assumido o movimento espírita ainda em 1870. Porém, esta informação do Desliens é bastante plausível se considerarmos que Leymarie, em seu ativismo político, era partidário da república de Thiers, o que tornava Paris um local perigoso a ele durante toda a guerra e, principalmente, durante a Comuna que só terminou em 28.05.1871.
xx.12.1872 - Lançamento da segunda impressão da QUINTA EDIÇÃO da Gênese, agora pela Librairie Spirite (conforme se pode verificar por noticie bibliographique da Bibliothèque Nationale de France). A BNF mantém esta edição em seu acervo com a identificação: FRBNF30010935.
A quarta edição tinha sido, ainda, publicada pela Librairie Internationale.
Aliás, hoje em dia, pela internet, pode-se encontrar o original de todas essas edições (1a2a3a4a5a) em várias bibliotecas francesas, assim como disponibilizadas em sites brasileiros.
Considerando que não há nenhuma correspondência de Amelie Boudet ou ata que modifique suas disposições contantes na Ata de 01.04.1869 (confirmadas na Revue de agosto do mesmo ano) de "tudo gerir pessoalmente e determinar a reimpressão das obras e publicações novas" podemos supor que a publicação desta quinta edição contou com sua participação. A Convenção de Berna, em seu artigo 6-bis, onde estabelece o direito do autor à paternidade e integridade de sua obra mesmo após sua morte, diz que tais direitos serão exercidos pelas pessoas ou instituições às quais a legislação nacional do país em que a proteção é reclamada dá legitimidade. No caso da França, são seus testamenteiros, quando houver e, quando não houver, seus herdeiros legais. Portanto estavam, a Amelie, tanto quanto a Comissão Central, perfeitamente legitimados para publicarem quaisquer textos ou revisões que Kardec tenha deixado no baú.
xx.xx.1873 - Neste ano Leymarie se encontra pela primeira vez com Helena Blavatsky. Podemos presumir, portanto, que sua aparente adesão (ou, ao menos, simpatia) à Teosofia deu-se após este ano e, não antes da publicação da Gênese revisada.
xx.xx.1875 - Neste ano ocorreu o famoso "Processo dos Espíritas", fartamente contado e documentado em vários livros e artigos, que levou Leymarie à prisão e submeteu Amelie Boudet a terríveis humilhações, o que tem sido atribuído por alguns articulistas espíritas como causa de uma certa senilidade precoce que teria permitido ao Leymarie apropriar-se do espólio de Kardec.
xx.xx.1876 - Publicação do "Catalogue Général de la Librairie Française" de Otto Lorenz, Tomo I, 1866-1875, que registra a publicação da 5a. edição da Gênese em 1873.
xx.xx.1883 - Segundo Desliens, fundição dos clichês da Gênese. (Revista Espírita, 1885).
xx.12.1884 - Henri Sausse, espírita, polemista, biógrafo de Kardec e iniciador da utilização midiática da expressão "espiritismo kardecista", após comparar o texto das edições da Librairie Internationale com o texto da edição da Libraire Spirite, acusa Leymarie de ter feito alterações na Gênese, gerando ruidosa celeuma no meio espírita. (Sites brasileiros, encontrados pelo Google; jornal Le Spiritisme, de Gabriel Delanne, dezembro 1884; O Legado de Kardec, de Pivato).
15.03.1885 - Desliens, que estava afastado do movimento espírita desde 1871, escreve uma carta à Sociedade com a intenção de defender Leymarie. Analisada historicamente, esta carta consegue mais confundir do que explicar, tendo em vista suas contradições.
Segundo ele, Kardec contratou com a Librairie Internationale as três primeiras edições, e, ainda em 1868, autorizou a 4a, 5a. e 6a. E que as matrizes destas três últimas serviram para as edições de 1869 a 187l (período em que ele esteve à frente do negócio) "e em diante". E sugere que Kardec tenha feito as alterações objeto da celeuma nestas placas, uma vez que eram fôrmas de letras soltas. Diz ainda que a última edição de 1868 era idêntica à primeira. (Revista Espírita, 1885). Esta última afirmação de Desliens pode, hoje, ser comprovada por qualquer pessoa que se disponha a cotejar as edições de 1868. Porém, nunca foram encontradas as tais "5a. e 6a," edições que teriam sido feitas sob sua gerência. Aliás, não se encontrou nenhuma edição feita entre 1869 e 1871.
Quanto à possibilidade de Kardec ter feito as alterações nas próprias placas "de letras soltas" pode ser descartada pois a comparação tipografica das quatro primeiras edições com a edição de 1872 (mesmo se feita precariamente pelas imagens) indica que foram feitas a partir de matrizes diferentes.
xx.xx.1911 - Guillon Ribeiro torna-se espírita, vindo a ocupar a presidência da FEB e a produzir inúmeras traduções, incluindo a Gênese de Kardec, que ele diz ter traduzido a partir do original da QUINTA EDIÇÃO. (Sites brasileiros, encontrados via Google).
É evidente que a tradução de Guillon Ribeiro foi feita após 1911; portanto, no mínimo, 27 anos após as denúncias de Henri Sausse, 38 anos após a publicação da edição que lhe serviu de base, e 41 anos após as alterações objeto das denúncias.
xx.08.1869 - A Revista Espírita de Agosto de 1869 noticia que a Madame Allan Kardec, no desejo de continuar a obra moralizadora à qual ela e seu esposo têm dedicado os últimos anos, resolve assumir a tarefa da continuidade do trabalho, incluindo a publicação das obras fundamentais e póstumas de Kardec, pelo tempo que lhe resta de vida, promovendo os planos deixados por ele, pois ela, mais que qualquer outro, possui os elementos indispensáveis para determinar solidamente as bases constitutivas. Assim, após superar as numerosas formalidades decorrentes da sucessão e estudando cuidadosamente o espírito de tais planos, resolve, com o concurso de outros seis espíritas, constituir a Sociedade Anônima de Ações de Interesse e Capital Variável da Caixa Central do Espiritismo, conforme o preconizara Kardec na Revista Espírita de dezembro de 1868. Segundo Berthe Froppo, em seu opúsculo "Muita Luz", "a Sociedade anônima fundada pela Sra. Allan Kardec tem por objetivo tornar conhecido o espiritismo por todos os meios autorizados pelas leis. Ela tem por base a continuação da Revista Espírita fundada por Allan Kardec, a publicação das obras deste, incluindo suas obras póstumas e todas as obras que tratam do espiritismo".(Revista Espírita, agosto, 1869; Berthe Froppo em "Muita Luz")).
xx.07.1870 - Descliens anuncia na Revista Espírita que a Livraria Espírita recebeu em depósito um certo número de exemplares dos Quatro Evangelhos, do Roustaing, obra provavelmente esgotada, e os coloca à disposição dos assinantes interessados, mediante o pagamento de "10 fr.50", à ordem de M. Bittard.
19.07.1870 - Desaba o teto! Estoura a Guerra Franco-Prussiana que dura até maio de 1871, destruindo o Segundo Império, precipitando a França num caos social e político, suscitando a Terceira República, terminando na Comuna de Paris, primeiro governo operário da história cujas lutas praticamente incendiaram a cidade. Os alemães vencedores só deixariam definitivamente a França em 1873 após o pagamento de pesadas "dívidas de guerra". O período de ocupação alemã foi bastante sofrível para os franceses, em todas as áreas, mas particularmente no campo editorial, tanto devido à censura, quanto devido ao altíssimo custo provocado pelos pesados impostos destinados às reparações de guerra.
01.06.1871 - Segundo informação de Desliens, esta é a data limite em que a Sociedade, a Revista e as impressões das obras de Kardec estiveram diretamente a cargo de Bittard, Tailleur e Desliens. (Revista Espírita, 1885). Presume-se que só a partir desta data Leymarie tenha assumido efetivamente tal mister. Algumas informações dão conta que Leymarie teria assumido o movimento espírita ainda em 1870. Porém, esta informação do Desliens é bastante plausível se considerarmos que Leymarie, em seu ativismo político, era partidário da república de Thiers, o que tornava Paris um local perigoso a ele durante toda a guerra e, principalmente, durante a Comuna que só terminou em 28.05.1871.
xx.12.1872 - Lançamento da segunda impressão da QUINTA EDIÇÃO da Gênese, agora pela Librairie Spirite (conforme se pode verificar por noticie bibliographique da Bibliothèque Nationale de France). A BNF mantém esta edição em seu acervo com a identificação: FRBNF30010935.
A quarta edição tinha sido, ainda, publicada pela Librairie Internationale.
Aliás, hoje em dia, pela internet, pode-se encontrar o original de todas essas edições (1a2a3a4a5a) em várias bibliotecas francesas, assim como disponibilizadas em sites brasileiros.
Considerando que não há nenhuma correspondência de Amelie Boudet ou ata que modifique suas disposições contantes na Ata de 01.04.1869 (confirmadas na Revue de agosto do mesmo ano) de "tudo gerir pessoalmente e determinar a reimpressão das obras e publicações novas" podemos supor que a publicação desta quinta edição contou com sua participação. A Convenção de Berna, em seu artigo 6-bis, onde estabelece o direito do autor à paternidade e integridade de sua obra mesmo após sua morte, diz que tais direitos serão exercidos pelas pessoas ou instituições às quais a legislação nacional do país em que a proteção é reclamada dá legitimidade. No caso da França, são seus testamenteiros, quando houver e, quando não houver, seus herdeiros legais. Portanto estavam, a Amelie, tanto quanto a Comissão Central, perfeitamente legitimados para publicarem quaisquer textos ou revisões que Kardec tenha deixado no baú.
xx.xx.1873 - Neste ano Leymarie se encontra pela primeira vez com Helena Blavatsky. Podemos presumir, portanto, que sua aparente adesão (ou, ao menos, simpatia) à Teosofia deu-se após este ano e, não antes da publicação da Gênese revisada.
xx.xx.1875 - Neste ano ocorreu o famoso "Processo dos Espíritas", fartamente contado e documentado em vários livros e artigos, que levou Leymarie à prisão e submeteu Amelie Boudet a terríveis humilhações, o que tem sido atribuído por alguns articulistas espíritas como causa de uma certa senilidade precoce que teria permitido ao Leymarie apropriar-se do espólio de Kardec.
xx.xx.1876 - Publicação do "Catalogue Général de la Librairie Française" de Otto Lorenz, Tomo I, 1866-1875, que registra a publicação da 5a. edição da Gênese em 1873.
xx.xx.1883 - Segundo Desliens, fundição dos clichês da Gênese. (Revista Espírita, 1885).
xx.12.1884 - Henri Sausse, espírita, polemista, biógrafo de Kardec e iniciador da utilização midiática da expressão "espiritismo kardecista", após comparar o texto das edições da Librairie Internationale com o texto da edição da Libraire Spirite, acusa Leymarie de ter feito alterações na Gênese, gerando ruidosa celeuma no meio espírita. (Sites brasileiros, encontrados pelo Google; jornal Le Spiritisme, de Gabriel Delanne, dezembro 1884; O Legado de Kardec, de Pivato).
15.03.1885 - Desliens, que estava afastado do movimento espírita desde 1871, escreve uma carta à Sociedade com a intenção de defender Leymarie. Analisada historicamente, esta carta consegue mais confundir do que explicar, tendo em vista suas contradições.
Segundo ele, Kardec contratou com a Librairie Internationale as três primeiras edições, e, ainda em 1868, autorizou a 4a, 5a. e 6a. E que as matrizes destas três últimas serviram para as edições de 1869 a 187l (período em que ele esteve à frente do negócio) "e em diante". E sugere que Kardec tenha feito as alterações objeto da celeuma nestas placas, uma vez que eram fôrmas de letras soltas. Diz ainda que a última edição de 1868 era idêntica à primeira. (Revista Espírita, 1885). Esta última afirmação de Desliens pode, hoje, ser comprovada por qualquer pessoa que se disponha a cotejar as edições de 1868. Porém, nunca foram encontradas as tais "5a. e 6a," edições que teriam sido feitas sob sua gerência. Aliás, não se encontrou nenhuma edição feita entre 1869 e 1871.
Quanto à possibilidade de Kardec ter feito as alterações nas próprias placas "de letras soltas" pode ser descartada pois a comparação tipografica das quatro primeiras edições com a edição de 1872 (mesmo se feita precariamente pelas imagens) indica que foram feitas a partir de matrizes diferentes.
xx.xx.1911 - Guillon Ribeiro torna-se espírita, vindo a ocupar a presidência da FEB e a produzir inúmeras traduções, incluindo a Gênese de Kardec, que ele diz ter traduzido a partir do original da QUINTA EDIÇÃO. (Sites brasileiros, encontrados via Google).
É evidente que a tradução de Guillon Ribeiro foi feita após 1911; portanto, no mínimo, 27 anos após as denúncias de Henri Sausse, 38 anos após a publicação da edição que lhe serviu de base, e 41 anos após as alterações objeto das denúncias.
xx.xx.1914: Sausse usa AG5 em artigo na Revista Espírita, 30 anos depois da denúncia. (Revista Espírita)
xx.xx.1925: Sausse se redime no Congresso Espírita dizendo que A Gênese revisada traduz o último pensamento do mestre. (Revista Espírita)
Século XXI - Carlos Brito Imbassahy, espírita brasileiro, refaz, cento e tantos anos depois, o caminho de Henri Sausse: compara o texto da terceira edição francesa da Gênese, de 1868 (da qual afirma possuir um exemplar), com a atual edição brasileira da FEB; constata as diferenças e acusa, inexplicavelmente, o tradutor brasileiro, Guillon Ribeiro, de ter feito as alterações. (Sites e blogs brasileiros, encontrados via Google).
xx.xx.2007 - A empresa Léon Denis Gráfica e Editora, do Rio, publica uma tradução da Gênese, de Albertina Escudeiro Sêco, afirmando ser baseada na QUARTA EDIÇÂO, de 1868, ainda da Librairie Internationale, da qual exibe fac-simile apenas da folha de rosto. Ousadamente, perpetra uma série de alterações no texto de Kardec, a pretexto de "atualizá-lo". (A Gênese, Léon Denis Gráfica e Editora).
Século XXI - Carlos Brito Imbassahy, espírita brasileiro, refaz, cento e tantos anos depois, o caminho de Henri Sausse: compara o texto da terceira edição francesa da Gênese, de 1868 (da qual afirma possuir um exemplar), com a atual edição brasileira da FEB; constata as diferenças e acusa, inexplicavelmente, o tradutor brasileiro, Guillon Ribeiro, de ter feito as alterações. (Sites e blogs brasileiros, encontrados via Google).
xx.xx.2007 - A empresa Léon Denis Gráfica e Editora, do Rio, publica uma tradução da Gênese, de Albertina Escudeiro Sêco, afirmando ser baseada na QUARTA EDIÇÂO, de 1868, ainda da Librairie Internationale, da qual exibe fac-simile apenas da folha de rosto. Ousadamente, perpetra uma série de alterações no texto de Kardec, a pretexto de "atualizá-lo". (A Gênese, Léon Denis Gráfica e Editora).
xx.xx.2010 - Este blogueiro, em pareceria com o historiador Felipe Gonçalves, trava debate com Imbassahy no grupo "Espiritismo - Estudos Avançados", do Facebook, e empreende intensa pesquisa, que resultou na primeira publicação desta postagem.
xx.xx.2012 - Este blogueiro faz um cotejo completo entre as duas versões da Gênese, em francês e portuguÊs, e o disponibiliza na internet sob o título "A GÊNESE - ATÉ QUE PONTO - DE KARDEC".
xx.xx.2018 - Publicação do livro "O Legado de Kardec", de Simoni Privato Goidanisch, seguido de uma intensa campanha em vídeos, teasers e seminários, com a participação de escritores e palestrantes espíritas, visando convencer o público que Leymarie alterou a Gênese de Kardec na quinta edição francesa da obra. O movimento culminou com a edição em livro da tradução de Carlos B. Imbassahy, com inúmeras alterações em relação à versão antes disponibilizada na internet além de adulterações em relação ao original francês.
xx.xx.2018 - Publicação do livro "O Legado de Kardec", de Simoni Privato Goidanisch, seguido de uma intensa campanha em vídeos, teasers e seminários, com a participação de escritores e palestrantes espíritas, visando convencer o público que Leymarie alterou a Gênese de Kardec na quinta edição francesa da obra. O movimento culminou com a edição em livro da tradução de Carlos B. Imbassahy, com inúmeras alterações em relação à versão antes disponibilizada na internet além de adulterações em relação ao original francês.
26.02.2020 - O pesquisador brasileiro Carlos Seth Bastos localiza um exemplar da 5a. Edição da Genese, "revue, corrigée et augmentée", na Biblioteca da Universidade de Neuchâtel, Suiça, datada de 1869, em sintonia, portanto, com a Declaração de Impressão de fevereiro de 1869. Esta descoberta coloca a última pá de cal sobre o esquife da teoria conspiratória iniciada com a publicação do livro "O Legado de Kardec".
Assim, temos atualmente duas versões da Gênese disponíveis no mercado editorial brasileiro. Uma, baseada na versão francesa fixada desde a quinta edição, publicada inicialmente em 1869 e com reimpressão em 1872 (quando então os impressores concluíram os trâmites burocráticos franceses com o depósito legal na BNF), traduzida por Guillon Ribeiro, Julio Abreu Filho, Salvador Gentille, e outros. Outra, baseada na versão primitiva de 1868, traduzida e alterada por Albertina Escudeiro Sêco. Além dessas, existe a tradução de Carlos Brito Imbassahy, baseada, segundo ele, na terceira edição, de 1868, e disponibilizada gratuitamente na internet (a partir de 2018 também em livro, conforme citado acima).
Bem, aí está o resultado de uma pesquisa histórica orientada por princípios científicos. Qualquer pessoa poderá comprovar ou refutar minhas afirmações acessando todo o material correspondente, hoje disponibilizado em bibliotecas e sites, conforme detalhei ao longo do texto.
Evidentemente, tal pesquisa contraria toda a mitologia estabelecida nas redes sociais sobre o assunto. Mas, isto é porque toda essa boataria foi motivada mais por disposições ideológicas do que pela pesquisa e análise racional dos fatos.
A 5a. edição, definitiva, está, em alguns pontos, muito melhor redigida que as anteriores. Algumas revisões foram, sem dúvida, para melhor. Outras podem ser acusadas de não estarem à altura de Kardec. Os trechos suprimidos no Capítulo XV não enfraquecem em nada a posição anti-roustainguista deixada clara por Kardec no item anterior. Tanto é que Guillon e a FEB obrigaram-se a notas de pé de página defendendo suas posições. Neste ponto, a revisão de Kardec atende ao princípio de que "não há nada menos convincente do que insistir ou exagerar um bom argumento".
Assim, temos atualmente duas versões da Gênese disponíveis no mercado editorial brasileiro. Uma, baseada na versão francesa fixada desde a quinta edição, publicada inicialmente em 1869 e com reimpressão em 1872 (quando então os impressores concluíram os trâmites burocráticos franceses com o depósito legal na BNF), traduzida por Guillon Ribeiro, Julio Abreu Filho, Salvador Gentille, e outros. Outra, baseada na versão primitiva de 1868, traduzida e alterada por Albertina Escudeiro Sêco. Além dessas, existe a tradução de Carlos Brito Imbassahy, baseada, segundo ele, na terceira edição, de 1868, e disponibilizada gratuitamente na internet (a partir de 2018 também em livro, conforme citado acima).
Bem, aí está o resultado de uma pesquisa histórica orientada por princípios científicos. Qualquer pessoa poderá comprovar ou refutar minhas afirmações acessando todo o material correspondente, hoje disponibilizado em bibliotecas e sites, conforme detalhei ao longo do texto.
Evidentemente, tal pesquisa contraria toda a mitologia estabelecida nas redes sociais sobre o assunto. Mas, isto é porque toda essa boataria foi motivada mais por disposições ideológicas do que pela pesquisa e análise racional dos fatos.
A 5a. edição, definitiva, está, em alguns pontos, muito melhor redigida que as anteriores. Algumas revisões foram, sem dúvida, para melhor. Outras podem ser acusadas de não estarem à altura de Kardec. Os trechos suprimidos no Capítulo XV não enfraquecem em nada a posição anti-roustainguista deixada clara por Kardec no item anterior. Tanto é que Guillon e a FEB obrigaram-se a notas de pé de página defendendo suas posições. Neste ponto, a revisão de Kardec atende ao princípio de que "não há nada menos convincente do que insistir ou exagerar um bom argumento".
sexta-feira, 25 de maio de 2012
AS SEITAS
Não é fácil definirmos uma seita.
Respeitáveis religiões constituídas, associadas a governos ou a impérios universitários, foram, em sua origem, seitas.
No final do milênio, quando algumas dessas coisas assustaram o mundo com pactos suicidas e loucuras do gênero, houve uma mobilização da ONU e de governos, preocupados em protegerem a sociedade e o indivíduo. Esbarraram nessas dificuldades.
Afinal, como o constataram os deputados franceses que, em 1995, se debruçaram sobre o assunto, não é fácil distinguir, seja pelos estudiosos ou pelos próprios adeptos:
- a livre associação - do grupo coercitivo;
- a convicção - da certeza essencial;
- o engajamento - do fanatismo;
- o prestígio do líder - do culto ao guru;
- as decisões voluntárias - das escolhas completamente induzidas;
- a integração leal a um grupo - da fidelidade incondicional;
- a hábil persuasão - da manipulação programada;
- o discurso motivador - da lavagem cerebral;
- o espírito de equipe - da fusão do grupo.
Se nos socorrermos na filosofia, vamos encontrar em Lalande uma definição sintética de "secte", semelhante ao conceito hoje generalizado: um grupo de pessoas que aderem estritamente a uma doutrina bem definida, e cuja adesão provoca uma forte união entre elas, ao mesmo tempo que as separa dos outros espíritos.
Os espíritas tendem a definir com inusitado rigor o rol de suas crenças. Fixam-se em posições cientificas, laicas, religiosas, agnósticas, teístas, deístas, cristãs, ecléticas, ortodoxas; e uma série de outras derivadas das inúmeras combinações possíveis entre estas.
Infensos ao diálogo, nas redes sociais temos visto a tendência em se reunirem por tais afinidades, segregando os que apresentam qualquer mínimo desvio da matriz eleita pelo grupo.
Estaremos nos dividindo, nas redes sociais, literalmente falando, em seitas?
Seria bom que verificássemos se não podemos identificar os critérios de Lalande ou as dificuldades dos deputados franceses nos diversos grupos que integramos.
Respeitáveis religiões constituídas, associadas a governos ou a impérios universitários, foram, em sua origem, seitas.
No final do milênio, quando algumas dessas coisas assustaram o mundo com pactos suicidas e loucuras do gênero, houve uma mobilização da ONU e de governos, preocupados em protegerem a sociedade e o indivíduo. Esbarraram nessas dificuldades.
Afinal, como o constataram os deputados franceses que, em 1995, se debruçaram sobre o assunto, não é fácil distinguir, seja pelos estudiosos ou pelos próprios adeptos:
- a livre associação - do grupo coercitivo;
- a convicção - da certeza essencial;
- o engajamento - do fanatismo;
- o prestígio do líder - do culto ao guru;
- as decisões voluntárias - das escolhas completamente induzidas;
- a integração leal a um grupo - da fidelidade incondicional;
- a hábil persuasão - da manipulação programada;
- o discurso motivador - da lavagem cerebral;
- o espírito de equipe - da fusão do grupo.
Se nos socorrermos na filosofia, vamos encontrar em Lalande uma definição sintética de "secte", semelhante ao conceito hoje generalizado: um grupo de pessoas que aderem estritamente a uma doutrina bem definida, e cuja adesão provoca uma forte união entre elas, ao mesmo tempo que as separa dos outros espíritos.
Os espíritas tendem a definir com inusitado rigor o rol de suas crenças. Fixam-se em posições cientificas, laicas, religiosas, agnósticas, teístas, deístas, cristãs, ecléticas, ortodoxas; e uma série de outras derivadas das inúmeras combinações possíveis entre estas.
Infensos ao diálogo, nas redes sociais temos visto a tendência em se reunirem por tais afinidades, segregando os que apresentam qualquer mínimo desvio da matriz eleita pelo grupo.
Estaremos nos dividindo, nas redes sociais, literalmente falando, em seitas?
Seria bom que verificássemos se não podemos identificar os critérios de Lalande ou as dificuldades dos deputados franceses nos diversos grupos que integramos.
domingo, 15 de abril de 2012
A DECISÃO SOBRE OS ANENCÉFALOS À LUZ DO ESPIRITISMO
A recente decisão do Supremo Tribunal Federal, permitindo à mulher, se o quiser, interromper a gestação de um feto anencéfalo, não contraria a Doutrina Espírita.
Ao contrário, a Doutrina Espírita a antecipou como um dos momentos na evolução da humanidade a caminho da regeneração.
De tal forma estavam os ministros sintonizados com a Filosofia Espírita que pareciam, em suas justificativas e votos, verdadeiros médiuns da equipe de Espíritos superiores que coordenaram a Codificação Kardequiana.
No Livro dos Espíritos, cuja primeira versão foi publicada por Allan Kardec em 1857, nas abordagens sobre o aborto, a par de considerá-lo uma transgressão das leis de Deus quando praticado voluntaria e desnecessariamente, é dada uma atenção especial aos natimortos, considerando-os "crianças sem espíritos", conforme podemos constatar pelo diálogo na Questão 356:
"- Existem natimortos que não foram destinados à encarnação de um Espírito?
- Sim, há os que jamais tiveram um Espírito designado para os seus corpos: nada deviam realizar por eles. É, então, somente pelos pais que essa criança veio.
- Um ser dessa natureza pode chegar a termo?
- Sim, algumas vezes, mas não vive.
- Toda criança que sobrevive ao nascimento, necessariamente tem um espírito nela encarnado?
- Que seria sem ele? Não seria um ser humano."
A expressão "essa criança veio", é um detalhe nos indicando que eles estão se referindo a uma criança, a um corpo de criança, semelhante a todas as crianças e, não, como poderia alguém supor, a uma massa disforme. Então, podemos ver que, mesmo sem um espírito -- e, consequentemente, sem um perispírito --, os mecanismos da codificação genética são suficientes por si mesmos para gerarem um corpo. (Não vem ao caso, neste artigo, discutirmos a integração entre estes dois fatores -- código genético e perispírito -- na formação do corpo).
Na sequência, Kardec pergunta aos Espíritos se "um ser dessa natureza pode chegar a termo", e estes confirmam, indicando claramente que, por natimorto, apesar do termo, não se entende necessariamente uma criança que tenha morrido "antes" de nascer. Conceituação que coincide com o léxico, como podemos constatar servindo-nos do dicionário mais divulgado da Língua Portuguesa, o popular Aurélio:
"Natimorto, s.m. Aquele que nasceu morto ou que, vindo à luz com sinais de vida logo morreu."
Esta sobrevida deve-se, talvez, a uma energia residual decorrente do próprio metabolismo que o entreteve durante a gestação; ou, olhando-se pelo lado espiritual, ao fluido vital da mãe que retorna ao manancial primitivo.
O Ministro Marco Aurélio Mello, relator do processo de legalização da interrupção da gravidez do feto anencéfalo explicou muito bem, amparado nos pareceres dos especialistas, que se trata de um natimorto: não há ninguém ali para nascer; aquele ser não tem condições de estar no mundo; e nasce morto ou sobrevive apenas algumas horas. Segundo ainda o ministro -- neste caso amparado não apenas nos especialistas, mas também no Ministro da Saúde --, qualquer médico, minimamente preparado, munido de uma ecografia, consegue diagnosticar precocemente o anencéfalo.
O relator, ainda, descreveu o feto anencéfalo; disse o quanto do cérebro deve faltar para que realmente "não tenha ninguém ali" (aspas e expressão minhas), e o quanto são diferentes os casos que podem ser encarados como simples deficiências, as quais permitem ao recém-nascido "estar no mundo", ainda que com limitações.
Os casos apresentados com estardalhaço pelos ativistas contrários à liberação não se enquandram, segundos os professores médicos consultados, em anencefalia.
Portanto, baseado nos pareceres dos doutores médicos especialistas no assunto, referendados pelos Ministros do Supremo, podemos ter a certeza de que o anencéfalo se enquadra naqueles casos em que O Livro dos Espíritos nos diz que não havia espírito reencarnante.
Os espíritos dizem que Deus permite uma gestação inútil, com um natimorto, para provação e expiação dos pais.
Kardec define "provas e expiações" como a suportação das vicissitudes da vida. Diz também que nosso planeta é um mundo de provas e expiações. Mas, diz que não ficaremos eternamente nesta condição. Estamos prestes, segundo ele, a galgar um degrau na escala dos mundos e nos tornarmos um mundo de regeneração; onde seguramente as vicissitudes da vida serão mais brandas.
Entre as vicissitudes que nos serviram de expiação nós já tivemos a peste bubônica, a poliomielite, a varíola, e outras doenças; sem falar das inúmeras gestações frustradas por incompatibilidade sanguinea. Com a descoberta das vacinas, e a detecção prévia de muitos desses males, estas coisas foram afastadas como mecanismos de expiação.
Podemos afirmar, no caso em discussão, que o progresso científico que permitiu a detecção do natimorto ainda no ventre materno, só pode ter sido permitido por Deus (caso contrário, não ocorreria).
Logo, temos forte razão para pensar que, pela vontade de Deus, extinguiu-se na humanidade a provação e expiação através da gestação dos natimortos, tal como foram extintas aquelas outras. Isto porque os homens responderam à altura aos desafios impostos por Deus, inventando os diagnósticos e os tratamentos adequados, e, dessa forma, aproximando cada vez mais nosso planeta da condição de um mundo regenerador.
Ao contrário, a Doutrina Espírita a antecipou como um dos momentos na evolução da humanidade a caminho da regeneração.
De tal forma estavam os ministros sintonizados com a Filosofia Espírita que pareciam, em suas justificativas e votos, verdadeiros médiuns da equipe de Espíritos superiores que coordenaram a Codificação Kardequiana.
No Livro dos Espíritos, cuja primeira versão foi publicada por Allan Kardec em 1857, nas abordagens sobre o aborto, a par de considerá-lo uma transgressão das leis de Deus quando praticado voluntaria e desnecessariamente, é dada uma atenção especial aos natimortos, considerando-os "crianças sem espíritos", conforme podemos constatar pelo diálogo na Questão 356:
"- Existem natimortos que não foram destinados à encarnação de um Espírito?
- Sim, há os que jamais tiveram um Espírito designado para os seus corpos: nada deviam realizar por eles. É, então, somente pelos pais que essa criança veio.
- Um ser dessa natureza pode chegar a termo?
- Sim, algumas vezes, mas não vive.
- Toda criança que sobrevive ao nascimento, necessariamente tem um espírito nela encarnado?
- Que seria sem ele? Não seria um ser humano."
A expressão "essa criança veio", é um detalhe nos indicando que eles estão se referindo a uma criança, a um corpo de criança, semelhante a todas as crianças e, não, como poderia alguém supor, a uma massa disforme. Então, podemos ver que, mesmo sem um espírito -- e, consequentemente, sem um perispírito --, os mecanismos da codificação genética são suficientes por si mesmos para gerarem um corpo. (Não vem ao caso, neste artigo, discutirmos a integração entre estes dois fatores -- código genético e perispírito -- na formação do corpo).
Na sequência, Kardec pergunta aos Espíritos se "um ser dessa natureza pode chegar a termo", e estes confirmam, indicando claramente que, por natimorto, apesar do termo, não se entende necessariamente uma criança que tenha morrido "antes" de nascer. Conceituação que coincide com o léxico, como podemos constatar servindo-nos do dicionário mais divulgado da Língua Portuguesa, o popular Aurélio:
"Natimorto, s.m. Aquele que nasceu morto ou que, vindo à luz com sinais de vida logo morreu."
Esta sobrevida deve-se, talvez, a uma energia residual decorrente do próprio metabolismo que o entreteve durante a gestação; ou, olhando-se pelo lado espiritual, ao fluido vital da mãe que retorna ao manancial primitivo.
O Ministro Marco Aurélio Mello, relator do processo de legalização da interrupção da gravidez do feto anencéfalo explicou muito bem, amparado nos pareceres dos especialistas, que se trata de um natimorto: não há ninguém ali para nascer; aquele ser não tem condições de estar no mundo; e nasce morto ou sobrevive apenas algumas horas. Segundo ainda o ministro -- neste caso amparado não apenas nos especialistas, mas também no Ministro da Saúde --, qualquer médico, minimamente preparado, munido de uma ecografia, consegue diagnosticar precocemente o anencéfalo.
O relator, ainda, descreveu o feto anencéfalo; disse o quanto do cérebro deve faltar para que realmente "não tenha ninguém ali" (aspas e expressão minhas), e o quanto são diferentes os casos que podem ser encarados como simples deficiências, as quais permitem ao recém-nascido "estar no mundo", ainda que com limitações.
Os casos apresentados com estardalhaço pelos ativistas contrários à liberação não se enquandram, segundos os professores médicos consultados, em anencefalia.
Portanto, baseado nos pareceres dos doutores médicos especialistas no assunto, referendados pelos Ministros do Supremo, podemos ter a certeza de que o anencéfalo se enquadra naqueles casos em que O Livro dos Espíritos nos diz que não havia espírito reencarnante.
Os espíritos dizem que Deus permite uma gestação inútil, com um natimorto, para provação e expiação dos pais.
Kardec define "provas e expiações" como a suportação das vicissitudes da vida. Diz também que nosso planeta é um mundo de provas e expiações. Mas, diz que não ficaremos eternamente nesta condição. Estamos prestes, segundo ele, a galgar um degrau na escala dos mundos e nos tornarmos um mundo de regeneração; onde seguramente as vicissitudes da vida serão mais brandas.
Entre as vicissitudes que nos serviram de expiação nós já tivemos a peste bubônica, a poliomielite, a varíola, e outras doenças; sem falar das inúmeras gestações frustradas por incompatibilidade sanguinea. Com a descoberta das vacinas, e a detecção prévia de muitos desses males, estas coisas foram afastadas como mecanismos de expiação.
Podemos afirmar, no caso em discussão, que o progresso científico que permitiu a detecção do natimorto ainda no ventre materno, só pode ter sido permitido por Deus (caso contrário, não ocorreria).
Logo, temos forte razão para pensar que, pela vontade de Deus, extinguiu-se na humanidade a provação e expiação através da gestação dos natimortos, tal como foram extintas aquelas outras. Isto porque os homens responderam à altura aos desafios impostos por Deus, inventando os diagnósticos e os tratamentos adequados, e, dessa forma, aproximando cada vez mais nosso planeta da condição de um mundo regenerador.
quarta-feira, 7 de março de 2012
A FILOSOFIA ESPÍRITA
Apesar de não ter, ou mesmo aparentar, a menor pretensão em tornar-se uma "escola filosófica", o espiritismo é, sem sombra de dúvida, uma filosofia. O filósofo espírita J. Herculano Pires demonstrou isto fartamente em toda sua obra, mas, principalmente, na "Introdução à Filosofia Espírita", em "Ciência Espírita", e, na sua "Introdução ao Livro dos Espíritos". Kardec coloca sobre o título de "O Livro dos Espíritos" a identificação "Filosofia Espiritualista", e inicia "O Evangelho Segundo do Espiritismo" com um resumo da doutrina de Sócrates e Platão, pretendendo, segundo o Herculano, inseri-lo na tradição filosófica do espiritualismo. Mas, eu diria mais: apesar do intenso diálogo travado por Kardec com o positivismo dominante na filosofia francesa de sua época, acredito que sua filiação se dá mais intimamente com o espiritualismo de Victor Cousin, o eclético "ditador filósofo" que dominou as cátedras correspondentes em Paris durante grande parte do século. E, já em sua fase juvenil, o espiritismo, levado por Gustave Geley, retoma uma trajetória em sintonia com o espiritualismo restaurado no século XX pelo filósofo e prêmio Nobel Henry Bergson. Chegando ao final do século como uma filosofia da ética -- cuja praxis é tanto individual como social --, cuja vivencia é buscada expontânea e naturalmente pelos seus adeptos, mas sistematizada pelo próprio Herculano e mais o filósofo argentino Humberto Mariotti. Não é surpresa essa evolução constante no período, com a contribuição de várias mentes, pois Lalande já observava que Kardec não é o único, mas apenas "le plus célèbre".
E as credenciais filosóficas do Herculano para iniciar -- e avançar razoavelmente -- nessa sistematização, caso não fossem confirmadas pelo Professor Jorge Jaime em sua extensa "História da Filosofia no Brasil", o seriam pelo seu enquadramento nas diversas acepções do verbete "philosophe", do "Vocabulaire" do Lalande, principalmente a acepção "E" (Herculano bacharelou-se e licenciou-se em filosofia pela USP), apesar da advertência do dicionarista francês de que "cet usage du mot n'est pas d'une bonne langue, si ce n'est quand il implique une nuance d'ironie" (ou seja, o uso do termo filósofo para profissionais professores e estudantes, comum em nosso país, só se justifica quando implica uma nuance de ironia).
Herculano faz uma afirmação ousada em sua "Ciência Espírita e suas Implicações Terapêuticas", de 1978, que tem recebido crítica de alguns estudantes de filosofia: "A Filosofia Espírita foi reconhecida pelo Instituto de França e figura no 'Dicionário Técnico da Filosofia', de Lalande".
Este dicionário é o "Vocabulaire Technique et Critique de la Philosophie", que André Lalande elaborou e publicou em fascículos durante as duas primeiras décadas do século XX. Não elaborou só. Travou profícua correspondência com vários filósofos contemporâneos -- Henri Bergson, Émile Meyerson, Édouard Le Roy, Maurice Blondel, Jules Lachelier, Léon Brunschvicg, Henri Delacroix, Frédéric Rauh, Georges Sorel, Pierre Janet, Edmond Goblot, Louis Couturat, Victor Delbos, e outros --, cujas contribuições se transformaram em notas de pé de página na edição definitiva. Herculano, sem dúvida, teve acesso à edição francesa, publicada apartir de 1926, em dois tomos (um terceiro, "Nouveau Supplement", foi acrescentado a partir de 1932), totalizando mais de mil páginas, uma vez que ainda não havia a edição brasileira, utilizada agora pelos seus críticos. No momento, tenho acesso à edição francesa de 1928, e à edição argentina de 1953, contendo, ambas, toda a discussão com os filósofos.
O verbete "spiritisme" já seria suficiente para permitir ao Herculano sua afirmação de que "figura no dicionário". Mas, é no verbete "spiritualisme" e, principalmente, na discussão entre os filósofos, ao pé da página, que a doutrina espírita ganha status de assunto filosófico.
Na acepção "D", Lalande repete a distinção feita por kardec entre "espiritismo" e "espiritualismo". Nas discussões, Brunschvicg, depois de observar que a conexão entre espiritualismo e sociologismo lhe parece derivar do "novo espiritualismo, que ocupa cada vez mais lugar no pensamento de Comte", escreve: "Não vejo, de forma alguma, que haja a menor razão para eliminar o espiritismo como uma das significações próprias do espiritualismo. Desconhece você assim a influência profunda e persistentes das crenças e das práticas espiritistas nas crenças e práticas religiosas, desde as mais antigas e rudimentares até as mais recentes". Mas, na sequência, Maurice Blondel acusa "alguns dos que comerciam com os espíritos" de confiscarem a acepção eclética do termo "porque não se contentam em ser espiritistas, ou porque o título de espiritualista é melhor aceito".
E Andre Lalande finaliza dizendo que ultimamente a palavra voltou a ter prestígio, mas "unicamente o uso que dela se tem feito anteriormente e os interesses filosóficos que ela representa em nossos dias podem determinar sua significação".
E as credenciais filosóficas do Herculano para iniciar -- e avançar razoavelmente -- nessa sistematização, caso não fossem confirmadas pelo Professor Jorge Jaime em sua extensa "História da Filosofia no Brasil", o seriam pelo seu enquadramento nas diversas acepções do verbete "philosophe", do "Vocabulaire" do Lalande, principalmente a acepção "E" (Herculano bacharelou-se e licenciou-se em filosofia pela USP), apesar da advertência do dicionarista francês de que "cet usage du mot n'est pas d'une bonne langue, si ce n'est quand il implique une nuance d'ironie" (ou seja, o uso do termo filósofo para profissionais professores e estudantes, comum em nosso país, só se justifica quando implica uma nuance de ironia).
Herculano faz uma afirmação ousada em sua "Ciência Espírita e suas Implicações Terapêuticas", de 1978, que tem recebido crítica de alguns estudantes de filosofia: "A Filosofia Espírita foi reconhecida pelo Instituto de França e figura no 'Dicionário Técnico da Filosofia', de Lalande".
Este dicionário é o "Vocabulaire Technique et Critique de la Philosophie", que André Lalande elaborou e publicou em fascículos durante as duas primeiras décadas do século XX. Não elaborou só. Travou profícua correspondência com vários filósofos contemporâneos -- Henri Bergson, Émile Meyerson, Édouard Le Roy, Maurice Blondel, Jules Lachelier, Léon Brunschvicg, Henri Delacroix, Frédéric Rauh, Georges Sorel, Pierre Janet, Edmond Goblot, Louis Couturat, Victor Delbos, e outros --, cujas contribuições se transformaram em notas de pé de página na edição definitiva. Herculano, sem dúvida, teve acesso à edição francesa, publicada apartir de 1926, em dois tomos (um terceiro, "Nouveau Supplement", foi acrescentado a partir de 1932), totalizando mais de mil páginas, uma vez que ainda não havia a edição brasileira, utilizada agora pelos seus críticos. No momento, tenho acesso à edição francesa de 1928, e à edição argentina de 1953, contendo, ambas, toda a discussão com os filósofos.
O verbete "spiritisme" já seria suficiente para permitir ao Herculano sua afirmação de que "figura no dicionário". Mas, é no verbete "spiritualisme" e, principalmente, na discussão entre os filósofos, ao pé da página, que a doutrina espírita ganha status de assunto filosófico.
Na acepção "D", Lalande repete a distinção feita por kardec entre "espiritismo" e "espiritualismo". Nas discussões, Brunschvicg, depois de observar que a conexão entre espiritualismo e sociologismo lhe parece derivar do "novo espiritualismo, que ocupa cada vez mais lugar no pensamento de Comte", escreve: "Não vejo, de forma alguma, que haja a menor razão para eliminar o espiritismo como uma das significações próprias do espiritualismo. Desconhece você assim a influência profunda e persistentes das crenças e das práticas espiritistas nas crenças e práticas religiosas, desde as mais antigas e rudimentares até as mais recentes". Mas, na sequência, Maurice Blondel acusa "alguns dos que comerciam com os espíritos" de confiscarem a acepção eclética do termo "porque não se contentam em ser espiritistas, ou porque o título de espiritualista é melhor aceito".
E Andre Lalande finaliza dizendo que ultimamente a palavra voltou a ter prestígio, mas "unicamente o uso que dela se tem feito anteriormente e os interesses filosóficos que ela representa em nossos dias podem determinar sua significação".
terça-feira, 24 de janeiro de 2012
A PREOCUPAÇÃO COM A QUALIDADE DA PRODUÇÃO MEDIUNICA
No final dos anos 60 e começo dos 70, os ares no movimento espírita eram outros. Ainda não tínhamos visto o "despertar dos magos" que já coloria a Europa e os EUA, e nossas manifestações culturais populares, de matrizes indígenas ou africanas, eram vistas com preconceitos. O espiritismo era, então, a mais procurada oferta em termos de espiritualidade. Eclodiam manifestações mediúnicas fantásticas, surrealistas, curadoras ou de efeitos físicos; os centros organizavam-se em torno de médiuns queridos em suas comunidades porém, duvidosos quanto à autenticidade do fenômeno; todos distanciados da abordagem sistemática da teoria, da doutrina ou do conhecimento. Para complicar as coisas, a FEB -- que por força do Pacto Áureo e de uma tendência centralizadora e autoritária que tomava conta da sociedade brasileira da época coordenava o movimento espírita com forte influência sobre o comportamento das federadas --, tinha, como seus dirigentes, pessoas refratárias a qualquer sistematização do ensino ou do aprendizado espírita; pessoas que combatiam mesmo iniciativas como cursos e escolas, fossem de doutrina espírita, ou de educação e orientação da mediunidade. Diziam temer a academização e a perda da singeleza buscada nas primícias do cristianismo
Em consequencia dessa situação, restava aos espíritas o aprendizado pelo esforço individual; pois nos centros raramente se ofereciam programas sistematizados; na imensa maioria deles os estudos era feitos aleatoriamente, com leituras de textos, conversas, etc.
Para o aprendizado teórico da doutrina espírita as consequencias não eram tão danosas, pois o estudo individual supria as deficiências de sistematização. Mas, para a prática mediúnica os efeitos eram realmente danosos. Os interessados no desenvolvimento mediúnico, os que viam-se às voltas com a emersão dos fenômenos, e até os obsedados, todos eram geralmente lançados em sessões de quase duas horas de duração, para que desenvolvessem a mediunidade na prática, na observação dos mais antigos. Se o candidato tivesse a sorte de integrar um bom grupo, com bons médiuns, feliz dele: pela imitação chegaria a um bom resultado. Mas, caso contrário, ele fatalmente assimilaria os condicionamentos, a falta de critério na identificação dos espíritos, as megalomanias, enfim, todas as viciações que costumam assediar a prática mediúnica. Some-se a isso uma crença errônea que ameaçava se generalizar, de que os médiuns eram seres privilegiados por conviverem com os espíritos, estando, portanto, dispensados das necessidades de estudo imposta aos demais mortais.
Neste cenário, um grupo de espíritas paranaenses resolveu seguir as sugestões de Kardec de que se fizessem cursos de espiritismo, enfim, que se sistematizasse o ensino. Como integravam órgãos federados, evitaram choques usando sempre denominações alternativas: cursos doutrinários eram "programas"; cursos de educação mediúnica eram "centros de educação mediúnica"; aulas eram "sessões".
Criaram, então, o Centro de Orientação e Educação Mediúnica - COEM, um programa composto de 30 sessões teóricas e 30 sessões práticas, intercaladas. As sessões teóricas contêm todo o conhecimento reunido sobre mediunidade nas diversas obras publicadas; as sessões práticas, como o próprio nome evoca, reúnem conhecimentos sobre as atividades práticas como concentração, passe, irradiação, sensações, psicografia, psicofonia, etc. Mas, a grande sacada foi o desenvolvimento gradativo nas sessões práticas. Estas sessões se iniciavam com uma rápida preleção sobre o assunto do dia, seguindo-se o exercício, que apresentava complexidade e duração crescentes. Nas primeiras práticas as pessoas se concentravam durante cinco minutos, depois passavam para dez, quinze, e assim sucessivamente,até um ponto em que se iam introduzindo as práticas citadas, chegando-se, ao final do curso, com sessões mediúnica completas, com vários minutos de duração. Ao final de cada sessão prática os participantes contavam suas sensações, percepções e, nos estágios mais avançados, liam suas produções mediúnicas. Este simples esforço de verbalização da experiência permitia a conscientização sobre suas reais potencialidades. A crítica, ostensiva, velada ou sugerida pelos companheiros, permitia a auto-crítica e a separação do joio do bom trigo. Por isso que uma prática corriqueira em todos os centros que aplicaram o COEM era a suspensão de todos os trabalhos práticos da casa, para que todos os médiuns participassem do programa. Após o término do programa, que durava no máximo dois anos, reorganizava-se os trabalhos da casa, agora embasados na consciência e conhecimentos adquiridos.
Na década de 70 esse programa teve uma aceitação muita grande. Centenas de centros, no Brasil e no exterior, o desenvolveram, coordenados pelo núcleo gerador sediado no Centro Espírita Luz Eterna, em Curitiba. A disseminação do programa foi tanta que um jornalista espírita chegou a separar o movimento espírita em "antes" e "depois" do COEM. E esta sigla tornou-se sinônimo de programas de desenvolvimento mediúnico, mesmo que redigidos por outras equipes que nem conhecem sua história, e aplicado das mais diversas maneiras, à revelia de seus criadores.
Ainda na década de 70 o programa passou por turbulências provocadas pela política interna do movimento espírita. Um dos expoentes da equipe chocou-se com um dos expoentes do movimento espírita, a coisa cindiu-se, quem antes divulgava o programa passou a combatê-lo. As novas gerações foram se formando dentro dessas facções, aceitando ou rejeitando o programa. Os que passaram a combatê-lo alegavam que o programa inibia os médiuns; não formava novos médiuns. Na verdade, o programa se contrapunha a uma prática que os deformava. O fato é que os Centros que o aplicaram naquela época, e as dezenas que até hoje o aplicam, vacinaram-se contra as aberrações, viciações e megalomanias surgidas da prática mediúnica desorientada.
Eu não participei da elaboração do COEM. Era muito jovem, tinha lá meus dezenove anos quando o elaboraram. Foram os "mais velhos", já na faixa dos trinta. Mas, eu participei do primeiro experimento; e da sua divulgação. Além disso, coordenei, mais recentemente,uma aferição que resultou na elaboração de uma nova versão, o COEM II. Hoje, o Centro Espírita Luz Eterna disponibiliza as duas versões do programa. A primeira, o COEM, propriamente dito, se bem que revisto, corrigido e atualizado pela equipe autora, é oferecido de forma impressa, através do site do CELE: www.cele.org.br. E o COEM II - a nova versão -, disponbilizado gratuitamente no site www.carlosparchen.net/coem2.html.
Em consequencia dessa situação, restava aos espíritas o aprendizado pelo esforço individual; pois nos centros raramente se ofereciam programas sistematizados; na imensa maioria deles os estudos era feitos aleatoriamente, com leituras de textos, conversas, etc.
Para o aprendizado teórico da doutrina espírita as consequencias não eram tão danosas, pois o estudo individual supria as deficiências de sistematização. Mas, para a prática mediúnica os efeitos eram realmente danosos. Os interessados no desenvolvimento mediúnico, os que viam-se às voltas com a emersão dos fenômenos, e até os obsedados, todos eram geralmente lançados em sessões de quase duas horas de duração, para que desenvolvessem a mediunidade na prática, na observação dos mais antigos. Se o candidato tivesse a sorte de integrar um bom grupo, com bons médiuns, feliz dele: pela imitação chegaria a um bom resultado. Mas, caso contrário, ele fatalmente assimilaria os condicionamentos, a falta de critério na identificação dos espíritos, as megalomanias, enfim, todas as viciações que costumam assediar a prática mediúnica. Some-se a isso uma crença errônea que ameaçava se generalizar, de que os médiuns eram seres privilegiados por conviverem com os espíritos, estando, portanto, dispensados das necessidades de estudo imposta aos demais mortais.
Neste cenário, um grupo de espíritas paranaenses resolveu seguir as sugestões de Kardec de que se fizessem cursos de espiritismo, enfim, que se sistematizasse o ensino. Como integravam órgãos federados, evitaram choques usando sempre denominações alternativas: cursos doutrinários eram "programas"; cursos de educação mediúnica eram "centros de educação mediúnica"; aulas eram "sessões".
Criaram, então, o Centro de Orientação e Educação Mediúnica - COEM, um programa composto de 30 sessões teóricas e 30 sessões práticas, intercaladas. As sessões teóricas contêm todo o conhecimento reunido sobre mediunidade nas diversas obras publicadas; as sessões práticas, como o próprio nome evoca, reúnem conhecimentos sobre as atividades práticas como concentração, passe, irradiação, sensações, psicografia, psicofonia, etc. Mas, a grande sacada foi o desenvolvimento gradativo nas sessões práticas. Estas sessões se iniciavam com uma rápida preleção sobre o assunto do dia, seguindo-se o exercício, que apresentava complexidade e duração crescentes. Nas primeiras práticas as pessoas se concentravam durante cinco minutos, depois passavam para dez, quinze, e assim sucessivamente,até um ponto em que se iam introduzindo as práticas citadas, chegando-se, ao final do curso, com sessões mediúnica completas, com vários minutos de duração. Ao final de cada sessão prática os participantes contavam suas sensações, percepções e, nos estágios mais avançados, liam suas produções mediúnicas. Este simples esforço de verbalização da experiência permitia a conscientização sobre suas reais potencialidades. A crítica, ostensiva, velada ou sugerida pelos companheiros, permitia a auto-crítica e a separação do joio do bom trigo. Por isso que uma prática corriqueira em todos os centros que aplicaram o COEM era a suspensão de todos os trabalhos práticos da casa, para que todos os médiuns participassem do programa. Após o término do programa, que durava no máximo dois anos, reorganizava-se os trabalhos da casa, agora embasados na consciência e conhecimentos adquiridos.
Na década de 70 esse programa teve uma aceitação muita grande. Centenas de centros, no Brasil e no exterior, o desenvolveram, coordenados pelo núcleo gerador sediado no Centro Espírita Luz Eterna, em Curitiba. A disseminação do programa foi tanta que um jornalista espírita chegou a separar o movimento espírita em "antes" e "depois" do COEM. E esta sigla tornou-se sinônimo de programas de desenvolvimento mediúnico, mesmo que redigidos por outras equipes que nem conhecem sua história, e aplicado das mais diversas maneiras, à revelia de seus criadores.
Ainda na década de 70 o programa passou por turbulências provocadas pela política interna do movimento espírita. Um dos expoentes da equipe chocou-se com um dos expoentes do movimento espírita, a coisa cindiu-se, quem antes divulgava o programa passou a combatê-lo. As novas gerações foram se formando dentro dessas facções, aceitando ou rejeitando o programa. Os que passaram a combatê-lo alegavam que o programa inibia os médiuns; não formava novos médiuns. Na verdade, o programa se contrapunha a uma prática que os deformava. O fato é que os Centros que o aplicaram naquela época, e as dezenas que até hoje o aplicam, vacinaram-se contra as aberrações, viciações e megalomanias surgidas da prática mediúnica desorientada.
Eu não participei da elaboração do COEM. Era muito jovem, tinha lá meus dezenove anos quando o elaboraram. Foram os "mais velhos", já na faixa dos trinta. Mas, eu participei do primeiro experimento; e da sua divulgação. Além disso, coordenei, mais recentemente,uma aferição que resultou na elaboração de uma nova versão, o COEM II. Hoje, o Centro Espírita Luz Eterna disponibiliza as duas versões do programa. A primeira, o COEM, propriamente dito, se bem que revisto, corrigido e atualizado pela equipe autora, é oferecido de forma impressa, através do site do CELE: www.cele.org.br. E o COEM II - a nova versão -, disponbilizado gratuitamente no site www.carlosparchen.net/coem2.html.
Assinar:
Postagens (Atom)